Escola de Curimba Cantar de Oxum

O TOQUE SAGRADO - Por: Élcio Povoa

Desde os primórdios, a humanidade emprega uma poderosa ferramenta como forma de comunicação, expressão e interação: a música.

Já dizia DE VALE que “Os instrumentos musicais podem servir como veículos de comunicação entre o mundo visível e o invisível”.

A Umbanda, por sua vez, utiliza músicas chamadas de pontos cantados, que são caracterizados por um conjunto notadamente africano mesclado por motivações indígenas. Desta forma, abrangem-se duas grandes influências culturais e etnográficas em sua realidade musical-instrumental.

Um dos grandes personagens dos pontos cantados é o atabaque, instrumento trazido ao Brasil pelas mãos dos africanos, mãos estas que, em conjunto com os tambores, acrescentaram à cultura brasileira uma riqueza rítmica inesgotável. Portanto, pode-se afirmar que o povo brasileiro é privilegiado, pois, tem uma de suas mãos brasileira e outra africana.

O atabaque, em seu modelo mais comum, apresenta-se em forma de tambor afunilado de madeira, recoberto com couro animal (boi, cabrito ou carneiro). Na maioria dos terreiros de umbanda e também de candomblé, são utilizados grupos de três, que recebem o nome de Rum, Rumpi e Lê. Rum (o maior, geralmente de 1,20 m e de timbre mais grave), Rumpi (o de tamanho intermediário, geralmente de 1,00 m e de timbre igualmente médio) e Lê (o menor, geralmente de 0,80 m e de timbre mais agudo). O Tamanho do bojo e a espessura do couro também influenciam diretamente na tonalidade do instrumento, quanto mais bojudo for seu formato e /ou mais grosso for o couro, mais grave será sua tonalidade.

Há diversos estudos que comprovam a intensidade do atabaque como instrumento de comunicação:

O atabaque tem um segredo e é preciso saber penetrar nele. Na África o toque difere dependendo do acontecimento a ser comunicado. Através da audição do toque, o receptor pode inferir se alguém nasceu, alguém morreu, ou ainda, se alguém está se casando. Significa que aquele que toca o atabaque conhece os seus códigos e faz com que o som transmitido comunique exatamente a mensagem desejada. O instrumento tocado pode nos levar a um profundo silêncio, ao recolhimento, a uma mística, a um momento de transcendência.

Na Umbanda, a percussão dos atabaques é feita com as mãos, sem o uso dos aguidavis, nela os ritmos dos rituais angola e congo são os mais presentes. Pode-se destacar o Samba de Angola, também chamado de Samba de Caboclo, Barravento, Congo de Ouro, Cabula, Ijechá, dentre outros polirritmos utilizados nos rituais.

Os atabaques podem ou não ser pintados ou vestidos com ojás de pano com as cores simbólicas das divindades homenageadas. Todo rigor é observado na manutenção dos preceitos voltados à fixação dos elementos mágicos relativos aos atabaques; iniciando pela boa conduta e postura dos atabaqueiros, que são responsáveis por tocar e zelar pelos instrumentos, seguidos por rituais de alimentação com o uso de pembas, banhas, óleos e outros elementos que são colocados nos atabaques.

Há, ainda, a possibilidade de serem feitas oferendas à Ayan (orisá do tambor) e, também, aos caboclos curimbeiros, com o objetivo de tornar o atabaque um instrumento sacralizado capaz de invocar energias, traçando um paralelo entre o mundo espiritual e o material. Para isso, é preciso muito preparo e conhecimento da maneira correta de manuseá-lo e percuti-lo.

Além do atabaque, na curimba de Umbanda, é comum encontrarmos também a presença do agogô, do ganzá e do xequerê, e ainda com menos freqüência outros instrumentos de percussão. Somente quem tem a oportunidade de presenciar esse instrumento em ação é que consegue compreender o que as palavras não conseguem descrever.